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por Cristiane Collich Sampaio
O rombo aos cofres públicos a cada ano chega a R$ 4,8 bilhões em tributos sobre combustíveis, produzido pelas diferentes formas de fraude. Essa constatação foi divulgada por Hélvio Rebeschini, diretor da Plural (ex-Sindicom), e corroborada por representantes de diversas instituições federais e do estado de São Paulo, no Fórum Estadão – Combate à Fraude e Sonegação. O evento foi realizado no dia 3 de maio, em São Paulo (SP), em conjunto pelo jornal e o Movimento Combustível Legal (MCL).
Na ocasião, Rebeschini declarou que em 2018 o setor de combustíveis deve arrecadar em tributos R$ 134 bilhões, salientando que, na maior parte dos estados, os impostos nesse setor são a principal fonte de arrecadação. Porém, a elevadíssima carga tributária – que, na gasolina, chega a 52% do preço final – é o que torna a sonegação um crime altamente rentável. E o chamado “devedor contumaz” vem se aproveitando disso, ao não pagar sistematicamente os impostos devidos e, com isso, obter larga vantagem competitiva, além de ‘quebrar’ seus concorrentes idôneos e, como consequência, aumentar ainda mais suas vendas. A este crime se unem os representados pela “bomba baixa” e pela adulteração, que também desestabilizam o mercado, enquanto que a excessiva demora no trâmite de processos e julgamentos provoca a sensação de impunidade.
LEGISLAÇÃO MAIS PRECISA
Durante os dois painéis de debate – Impacto da sonegação para a sociedade e Como combater a sonegação e as fraudes – foi feita a radiografia do setor e foram apontadas soluções.
Entre estas está a aprovação do PLS 284, que caracteriza o sonegador contumaz e o diferencia do devedor eventual, e a reinterpretação da Súmula 70 do Supremo Tribunal Federal (STF), que determina que o pagamento de tributos não pode se dar de forma coercitiva, entendimento que dificulta a cobrança desses sonegadores recorrentes. Há consenso quanto à concessão de liminares para o não pagamento de impostos, porém, somente mediante o depósito do valor devido em juízo.
Os presentes ainda se mostraram favoráveis à uniformização das alíquotas do ICMS, para evitar a guerra fiscal e a sonegação nas vendas interestaduais de combustíveis, e à cobrança monofásica desse imposto. Também foi recomendada a revisão, pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), das legislações referentes à importação de produtos e à receptação de produto roubado.
Ao lado de integrantes do Estadão e da Plural, instituições públicas de peso também estiveram representadas entre os expositores e debatedores convidados para o evento: ANP, Procuradoria Geral do Estado (PGE-SP), Ministério Público Federal (MPF), Secretaria da Fazenda do Estado (Sefaz-SP), Superintendência da Receita Federal (SRF-SP), Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e Associação Paulista de Magistrados (Apamagis).
Segundo o procurador Victor Hugo Ferreira, da Polícia Federal, há organizações criminosas – como a detectada por sua equipe na Operação Rosa dos Ventos, que agia na região de Campinas – que são criadas e atuam com o propósito de sonegar. “Até agora, a operação apurou que R$ 5 bilhões foram sonegados pela quadrilha”, informou.
Ele avalia que a legislação atual do ICMS incentiva a sonegação, já que é complicada e tem brechas.
TRAMITAÇÃO MAIS RÁPIDA
A PGE está buscando formas de tornar mais rápida a tramitação de processos. De acordo com a subprocuradora Maria Lúcia de Oliveira Dias, a casa passou a “cobrar pela dívida ativa por meio de protesto”, tese já consagrada em São Paulo, que torna a tramitação mais ágil. Conforme enfatizou, “a resposta institucional é muito importante para romper com a ideia de impunidade”. Segundo ela, há magistrados que já entenderam que a ação dos devedores recorrentes é uma forma de fraude fiscal.
“O devedor contumaz cria a empresa para não pagar impostos pois, caso os pague, esta tornar-se-á inviável”, declarou o coordenador da Administração Tributária da Sefaz-SP, Luiz Cláudio de Carvalho, elogiando a lei paulista (1.320/2018), que definiu essa figura e as formas de cobrá-la. Para ele, é essencial o trabalho conjunto das instituições, mas também é fundamental a mobilização do setor. “Hoje, o Ipem-SP detecta a bomba-baixa e remete o processo para a Fazenda do estado, já que essa fraude também leva à sonegação”, citou como exemplo.
O juiz Fernando Figueiredo Bartiletti, da Apamagis, acrescentou que também é necessário investigar os escritórios de advocacia que defendem esses criminosos e, também, os meios de lavagem desse dinheiro ilícito.
O uso de tecnologia, como de Big Data, de cruzamento de dados, está contribuindo para agilizar o trâmite dos processos nacionalmente, informou o procurador da PGFN, Rogério Campos. “A morosidade do Judiciário alimenta a sonegação e a impunidade”, afirmou, acrescentando também ser necessário sensibilizar juízes para o caso dos devedores contumazes.
O superintendente da seção São Paulo da Receita Federal, José Guilherme de Vasconcelos, por sua vez, falou da unanimidade quanto à necessidade de simplificação da tributação, apesar da resistência do Congresso Nacional quanto a isso. Também esclareceu que “hoje a Receita monitora as empresas que estão em processo, verificando a existência de coligadas, a transferência de bens etc.”.
O evento foi encerrado com a apresentação de uma palestra pelo economista Ricardo Amorim. Na exposição, ele defendeu o ICMS monofásico, com alíquota fixa em reais (e não percentual), para facilitar a previsão de arrecadação dos estados e para que o tributo tenha menor impacto sobre o preço dos combustíveis, quando de sua variação. Declarou, ainda, que em breve o Brasil terá de reduzir sua carga tributária e se mostrou otimista quanto ao futuro econômico do país.