por Elaine Paganatto


 


 Em meados de março um fato causou indignação. O Sincopetro vinha desenvolvendo um trabalho havia meses para avaliar quantos postos de supermercados estavam operando com a Inscrição Estadual (IE) individualizada, como manda o Decreto (nº 51 131/06, que regulamenta a Lei nº 11 929, de abril de 2005).


Para levantar esses dados, uma equipe da entidade paulista passou a recolher cupons fiscais em todas as regiões da capital e interior em que se encontravam postos instalados em hi­per­mercados. Foram realizadas compras na rede e, posteriormente, abastecido no posto.


Porém, durante essa análise do mercado, o Sinco­petro pôde comprovar que havia posto de supermercado praticando margem de apenas R$ 0,02. A distribuidora Texaco vendia o combustível a R$ 2,1723 e no mesmo dia o preço na bomba era de R$ 2,199, como monstra o cupom fiscal entregue ao consumidor no abastecimento. O caso refere-se ao Auto Posto Siguá (Extra), de Guarulhos (SP).


Caso semelhante ocorreu com o Auto Posto MFP (Extra), que comprou   a   R$ 2,165 e   também   vendia   a R$ 2,199. O que causa espanto é que ambas as situações constavam do site da ANP, em Levantamento de Preços, caracterizando o pleno conhecimento da agência sobre situações dessa natureza, e, ao mesmo tempo, a ineficiência da mesma em tomar providências para erra­dicar o problema.


Indignado o presidente do Sin–copetro, José Alberto Paiva Gouveia, questiona: “Como é possível a concorrência ser destruída dessa maneira, sem a menor chance de competir em igualdade de condições? Nem mesmo se o dono de posto de rua fizesse mágica conseguiria chegar a preços tão irreais quanto os demonstrados”.


Para o presidente da entidade, só há duas saídas para o mercado tradicional da revenda de combustíveis: “fechar o posto ou valer-se de outras alternativas não consideradas tão honestas”, desabafa. 


 


Explicação


não convence


Dando continuidade ao trabalho que descor­tinaria o cenário do mercado de combustíveis, iniciado em setembro de 2006, o Sin­co­petro conseguiu reunir um vasto ma­te­rial acerca dos postos de hi­per­mer­ca­dos e seus vizinhos.


O estudo apontou a existência de 79 postos em operação instalados em hipermercados no estado de São Paulo, dos quais apenas 20 tinham a IE individualizada. Os outros 59 continuavam ope­rando com a mesma inscrição utilizada pelo supermercado (e provavelmente casos de margens irrisórias também seriam encontrados nesses estabelecimentos).


Questionada, a Secretaria da Fazenda de São Paulo (Sefaz), a quem cabe a fiscalização da IE, afirmou, por intermédio de sua Assessoria de Comunicação, que a quase totalidade dos postos revendedores localizados na área de hipermercados já haviam obtido a inscrição individualizada no cadastro de contribuintes do ICMS.


A informação da Sefaz não condiz com o levantamento de dados do Sincopetro. Ele comprova a mesma IE para ambos os comércios, em vários casos apresentados.


O que pode estar ocorrendo, de acordo com a Sefaz, é que “vários postos ainda não registraram a IE nova na Agência Nacional do Petróleo (ANP) e, por isso, ainda estão operando com a do supermercado”. E continua observando que “de toda forma, o mais importante nesse caso não é a questão formal da inscrição, mas o lançamento do crédito que está vetado pela legislação independentemente da inscrição estar ou não individualizada”. 


A explicação da Sefaz procura ser plausível, mas não é convincente. Se muitos postos ainda não conseguiram registrar uma nova IE na ANP é porque deve ter ocorrido problemas com a documentação obrigatoriamente apresentada para o cumprimento das exigências da Portaria CAT nº 28, de 20 de abril de 2005. (Veja a Portaria na íntegra no site do Sincopetro, em Legislação).


Na ilegalidade


Se esses estabelecimentos não estão cumprindo a legislação, funcionam na ilegalidade e, pior, impunemente.


Mas apesar das evidências, a Sefaz é tachativa ao afirmar que “não há tolerância para quem não cumprir a lei”. A multa para os casos de não cumprimento é de oito Ufesps por mês de atividade ou fração (alínea “a”, do inciso VI, do art. 527 do RICMS) e multa de 100% (alínea “j”, do inciso II, do art. 527 do RICMS), sem prejuízo do pagamento do valor indevidamente escriturado, quanto ao crédito de ICMS, se lançado.


No entanto, o Sincopetro provou que os postos de supermercados estão funcionando tranqüilamente sem que ninguém os perturbe.


Para Gouveia, é fundamental que se regularizem as inscrições, já que os postos, chamados tradicionais, sofrem a desvantagem da concorrência pelo volume comprado e ainda a do crédito de ICMS em outras mercadorias. “Não é possível que uma lei entre em vigor e não seja respeitada”, salienta. E destaca também que é preciso acabar com as situações em que as margens são inexpressívas, “o que só pode estar ocorrendo para acabar com os postos de rua”.


 


Enquanto isso....


Enquanto os postos de hipermercados operam, digamos, na ilegalidade, no que se refere a IE, e praticam preços irreais ao consumidor, os estabelecimentos vizinhos estão desaparecendo por não conseguirem competir. 


Para ilustrar a situação a que se refere Gouveia,destacam-se mais dois casos observados no estudo: para igualar-se à venda de álcool de um posto Extra, localizado na região central da capital, seria necessário que o posto de rua, estabelecido nos arredores - tivesse uma margem de apenas R$ 0,06, já que este compra o produto da distribuidora a R$ 1,0381 e o posto Extra vende a R$ 1,0990. O Carrefour, de Guarulhos, vendia a gasolina a R$ 2,330 e o posto vizinho comprava a R$ 2,259 e, para concorrer com o hipermercado, somente se espremesse a sua margem para R$ 0,071. “Não há condições de continuarmos trabalhando dessa maneira”, afirma o presidente Gouveia.


O Sincopetro vem tentando chamar a atenção das autoridades para a investida dos hipermercados no segmento da revenda. No último dia 12 de fevereiro esteve na ANP, cuja pauta, entre outros assuntos, abordava a questão (na ocasião apresentou o estudo de mercado). No dia 16 de março, enviou denúncia à ANP, entre outros órgãos, destacando o caso do Auto Posto Siguá (Extra), buscando alertar para a concorrência predatória e para a conseqüente “morte” dos postos tradicionais.